Desde 2007, o STF julgou 284 temas com repercussão geral. Entre agosto
de 2014 e junho de 2016, na gestão do ministro Ricardo Lewandowski na
Presidência da Corte, foram analisados 83 deles, o que corresponde a 30%
do total. Os 83 casos julgados liberaram, pelo menos, 76.213 processos
que estavam sobrestados no Poder Judiciário aguardando a decisão do
Supremo sobre tema de natureza constitucional. Os números atestam a
prioridade conferida pelo ministro em pautar para julgamento recursos
dessa natureza, uma vez que possibilitam a pacificação da matéria, que
deve ser aplicada pelas demais instâncias.
A repercussão geral é um instituto criado pela Emenda Constitucional
45/2004 (Reforma do Judiciário) e implantado em 2007 a partir de normas
regimentais. Ele permite ao Supremo julgar questões relevantes do ponto
de vista econômico, político, social ou jurídico, que ultrapassem os
interesses subjetivos da causa. O tema é discutido em recursos
extraordinários que tratam de casos concretos, porém que são usados como
paradigmas (ou leading cases) para que a Corte examine a matéria de
fundo.
Sistema prisional
Entre os principais temas julgados sob o instituto da repercussão
geral nos últimos dois anos estão matérias que tratam dos direitos dos
condenados que vivem sob os cuidados do sistema prisional brasileiro. Em
um desses casos (RE 641320), julgado no final de junho de 2016, a Corte
estabeleceu tese no sentido de que a falta de estabelecimento penal
adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional mais
gravoso. Decidiu, também sob o enfoque da repercussão geral (RE
841526), que a morte de detento em estabelecimento penitenciário gera
responsabilidade civil do Estado quando presente a inobservância do seu
dever de proteção, e que o Judiciário, provocado pelo Ministério
Público, pode impor a realização de obras em presídios para garantir os
direitos fundamentais dos detentos.
Campos eletromagnéticos
Outro julgamento importante, analisado em repercussão geral (RE
627189), foi o que derrubou a decisão que determinava a redução do campo
eletromagnético de linhas de transmissão, em razão de suposto risco
cancerígeno aos seres humanos. Para a Corte, até prova científica sobre
os efeitos desses campos magnéticos, devem ser adotados os parâmetros de
proteção da Organização Mundial da Saúde (OMS), previstos na Lei
11.943/2009. Por sua complexidade, o tema chegou a ser objeto de
audiência pública realizada pelo STF.
Concurso público
Ao analisar recurso extraordinário (RE 837311) sobre o direito de
candidatos em concursos públicos, a Corte decidiu, em dois julgados, que
“o surgimento de novas vagas ou a abertura de novo concurso para o
mesmo cargo, durante o prazo de validade do certame anterior, não gera
automaticamente o direito à nomeação dos candidatos aprovados fora das
vagas previstas no edital". Ficam ressalvadas as hipóteses de preterição
arbitrária e imotivada por parte da Administração, caracterizada por
comportamento tácito ou expresso do Poder Público capaz de revelar a
inequívoca necessidade de nomeação do aprovado durante o período de
validade do certame, a ser demonstrada de forma cabal pelo candidato.
Sobre o tema concurso, em abril de 2015, o STF decidiu, em processo
com repercussão geral reconhecida (RE 632853), que os critérios adotados
por banca examinadora de concurso público não podem ser revistos pelo
Poder Judiciário. E em setembro de 2014, definiu que os serviços sociais
autônomos, por possuírem natureza jurídica de direito privado e não
integrarem a Administração Pública, não estão sujeitos à observância da
regra de concurso público para contratação de seu pessoal, mesmo que
desempenhem atividade de interesse público em cooperação com o ente
estatal. Também quanto aos servidores públicos, o Supremo definiu, em
agosto de 2014, que as vantagens remuneratórias de caráter geral
conferidas a eles, por serem genéricas, são extensíveis a inativos e
pensionistas.
Direito trabalhista
Decisão importante, no âmbito do direito trabalhista, foi tomada
pelo Supremo em abril de 2015 na análise do RE 590415. Na ocasião, a
Corte definiu que a transação extrajudicial que leva à rescisão do
contrato de trabalho em razão de adesão a programa de desligamento
incentivado (PDI) enseja a quitação ampla e irrestrita de todas as
parcelas objeto do contrato de emprego, caso a condição conste
expressamente do acordo coletivo que aprovou o PDI e dos demais
instrumentos celebrados com o empregado.
No direito civil, um dos destaques ficou por conta da decisão tomada
no RE 611639 em outubro de 2015, segundo a qual “é desnecessário o
registro em cartório do contrato de alienação fiduciária de veículos”.
Penal
Sobre direito processual penal, a Corte decidiu, em maio de 2015,
pela constitucionalidade do poder investigatório do Ministério Público,
mas fez uma série de observações, que foram resumidas na tese aprovada
em Plenário. “O Ministério Público dispõe de competência para promover,
por autoridade própria, e por prazo razoável, investigações de natureza
penal, desde que respeitados os direitos e as garantias que assistem a
qualquer indiciado ou a qualquer pessoa sob investigação do Estado,
observadas, sempre, por seus agentes, as hipóteses de reserva
constitucional de jurisdição e, também, as prerrogativas profissionais
de que se acham investidos, em nosso País, os advogados (Lei 8.906/1994,
art. 7º, notadamente os incisos I, II, III, XI, XIII, XIV e XIX), sem
prejuízo da possibilidade — sempre presente no Estado Democrático de
Direito — do permanente controle jurisdicional dos atos, necessariamente
documentados (Enunciado 14 da Súmula Vinculante), praticados pelos
membros dessa Instituição”. A decisão foi tomada no RE 593727.
E, no direito penal, o destaque é para a decisão de outubro de 2015,
segundo a qual o STF confirmou que compete à Justiça Federal processar e
julgar os crimes consistentes em disponibilizar ou adquirir material
pornográfico envolvendo crianças e adolescentes (RE 628624).
“A entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita,
mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões,
devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa
ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade
disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade dos
atos praticados”. Essa foi a tese aprovada pela Corte em novembro de
2015 no julgamento de RE 603616 com repercussão geral reconhecida.
Outro tema relevante foi definido pela Corte em novembro do mesmo
ano, no ramo do direito processual coletivo. A Corte confirmou que a
Defensoria Pública tem legitimidade para a propositura de ação civil
pública em ordem a promover a tutela judicial de direitos difusos e
coletivos de que sejam titulares, em tese, as pessoas necessitadas (RE
733433).
Outros temas
Em outros casos relevantes, a Corte decidiu que incide IPI na
importação de automóveis por pessoas físicas para uso próprio, e que é
legítima a publicação, inclusive em site eletrônico mantido pela
Administração Pública, do nome dos servidores e dos valores dos
correspondentes vencimentos e vantagens pecuniárias (RE 723651). Decidiu
que não pode haver prazos diferenciados para concessão de licença
maternidade para servidoras públicas gestantes e adotantes (RE 778889), e
que é inconstitucional a possibilidade de pacientes do Sistema Único de
Saúde (SUS) pagarem para ter acomodações superiores ou serem atendidos
por médicos de preferência (RE 581488).
Em junho de 2015, a Corte firmou tese no sentido de que o habeas
data é a garantia constitucional adequada para a obtenção, pelo
contribuinte, dos dados sobre pagamentos de tributos constantes de
sistemas informatizados de apoio à arrecadação dos órgãos da
administração fazendária dos entes estatais (RE 673707). Em março,
firmou tese no sentido de que as leis orgânicas dos municípios não podem
normatizar direitos de servidores, por ofensa à iniciativa do chefe do
Poder Executivo (RE 590829), e também que o município é competente para
legislar sobre meio ambiente, com a União e o Estado, no limite de seu
interesse local e desde que esse regramento seja harmônico com a
disciplina estabelecida pelos demais entes federados (RE 586224). Já em
agosto, assentou tese no sentido de que é constitucional a atribuição às
guardas municipais do exercício de poder de polícia de trânsito,
inclusive para imposição de sanções administrativas legalmente previstas
(RE 658570).
http://www.aasp.org.br/aasp/imprensa/clipping/cli_noticia.asp?idnot=22162